SAPIÑALA TEM SIM RAZÃO: DURANTE MUITO TEMPO O MPLA QUERIA SIM O PARTIDO ÚNICO PARA ANGOLA- ANASTÁCIO RUBEN SICATO



Num debate havido ontem, 14.01.2022,  na TV Zimbo, o dirigente da UNITA Adriano Sapiñala defendeu a ideia segundo a qual o sistema multipartidário vigente em Angola foi posição da UNITA contra a posição monopartidária defendida pelo MPLA.

Alguns analistas contrariaram Adriano Sapiñala, mas a verdade é que ele é que está certo e todo o mundo sabe disso. Vamos apresentar alguns factos:


1. Durante o processo de transição para a independência, a posição portuguesa foi muito ambígua em relação a Angola. No geral, os portugueses queriam uma Angola dirigida pelo MPLA, o que implicava desfazerem-se da FNLA e da UNITA. 




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Spínola achava que a UNITA se deveria juntar à FNLA e ambas deveriam acabar com o MPLA. Alguns dos militarem do MFA (Movimento das Forças Armadas) defendiam uma aliança entre a UNITA e o MPLA e, ambas deveriam acabar com a FNLA. Os portugueses foram mais longe: em fases diferentes, enviaram delegações a Cangumbe, nas bases da UNITA, para convencer o Dr. Savimbi disso, mas ele rejeitou ambos os posicionamentos. É ler Alexandra Marques (Segredos da descolonização de Angola, Editora D. Quixote, Lisboa, 2013) e o próprio Jonas Savimbi (Angola: a Resistência em busca de uma Nova Nação, Editora Agência Portuguesa de Revistas, Lisboa, 1979).


2. Recomeçada a guerra, em inúmeras entrevistas, Savimbi se predispôs a negociar com o governo de Luanda um acordo com o MPLA, tendo como objectivo a criação de um futuro estado multipartidário. O Manifesto do Rio Cuanza, de Maio de 1976, mostra bem o estado de espírito da UNITA que, apesar de estar a avançar para uma guerra total, deixava aberta a porta para uma negociação no quadro de um estado multipartidário. Ora, o MPLA negou essa ideia de se negociar com a UNITA, pois acreditava no fim da UNITA com base numa victória militar.


3. Com o agravar da situação militar e o impasse criado para o problema angolano, o MPLA desenvolveu a ideia da harmonização nacional com base na integração dos dirigentes dos partidos derrotados (FNLA e UNITA) no MPLA. Vários dirigentes da FNLA aceitaram a ideia e foram integrados no MPLA, não tendo sido reconhecida a FNLA no quadro do ordenamento jurídico angolano, mas os dirigentes da UNITA não aceitaram isso e continuaram a exigir um estado multipartidário. É ler as entrevistas dos dirigentes de ambos os partidos (MPLA e UNITA) ao longo dos anos 80.


4. Em 1989, o MPLA conseguiu convencer o Marechal Mobutu a convocar uma Conferência em Gbadolite (República do Zaire), onde acreditavam que se conseguiria a paz, com base no exílio de Jonas Savimbi e na integração dos dirigentes da UNITA no MPLA. Ou seja, Angola continuaria a ser um estado monopartidário dirigido pelo MPLA. Essa tese – que de início estava camuflada nos meandros das negociações secretas – foi redondamente rejeitada por Jonas Savimbi que num comício na Jamba disse preto no branco: “O Marechal mentiu”. Na realidade, Mobutu não tinha tido a coragem de dizer claramente a Savimbi qual era o objectivo último desse Acordo de Gbadolite.


5. 1990 foi o ano das negociações que culminaram nos Acordos de Bicesse de Maio de 1991. Em várias rondas negociais, os dirigentes do MPLA tentaram convencer os negociadores da UNITA para que aceitassem desfazer-se da UNITA e integrar-se no MPLA. Isso é tão verdade que – quando começaram as negociações – o MPLA dizia que estava a negociar com alguns membros da UNITA. Ou seja, não estaria a negociar com a própria UNITA. É ler Jardo Muekália (Angola: A Segunda Revolução, Sextante Editora, Lisboa, 2015) que explica bem isso.


Para exemplo do que escrevo, veja-se: a 12 de Setembro de 1990, uma delegação do governo chefiada pelo general Roberto Leal Monteiro "Ngongo" e que integrava o embaixador Pacavira convocou uma conferência de imprensa no Hotel Jefferson. Nessa conferência de imprensa, o governo angolano disse que não podia estender reconhecimento legal à UNITA como partido político porque a actual Constituição sustentava um sistema de partido único e não poderia ser alterada de um momento para o outro. 


Isso saiu mal ao governo que teve de mudar a sua posição. Assim, numa videoconferência ocorrida a 15 de Setembro de 1990, com os membros da Comissão das Relações Exteriores da Câmara dos Representantes americana, o Presidente Eduardo dos Santos teve de admitir que o governo angolano estava disposto a alterar a Constituição para aceitar o multipartidarismo. (Jardo Muekália, obra citada, página 271).


Mas, na quarta ronda negocial que teve lugar a 24 de Setembro de 1990, em Sintra, o governo continuou a defender o monopartidarismo. Só em Dezembro de 1990, no seu III Congresso, o MPLA aceitou formalmente o multipartidarismo.  Foi assim que aconteceu.


Foi preciso pois batalhar bastante tempo para se mudar a posição do MPLA que teve de fazer uma revisão pontual da Constituição de 1975 para aceitar o multipartidarismo.


Portanto, ontem Adrano Sapiñala esteve muito bem. A posição de que o MPLA queria fosse aceite pela UNITA era mesmo o monopartidarismo, mas acabou por aceitar o pluripartidarismo.



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